Dirigido e roteirizado por Coralie Fargeat, ‘A Substância’ apresenta uma mescla interessante entre drama, irreverência, ficção científica e terror gore. Marcado por uma forma arrojada, o roteiro é bem amarrado. Porém, a cineasta prioriza os excessos, mesmo que isso deixe em suspenso o aspecto crível em momentos pontuais.
Na trama, a célebre Elisabeth Sparkle completa 50 anos e passa a lidar com a decadência de uma carreira até então próspera diante das câmeras. Sob a pressão de um sistema etarista e cruel, ela se submete a uma experiência científica a fim de se tornar, supostamente, uma ‘melhor’ versão de si.
Dito isso, vale ressaltar que a narrativa é marcada por inserções e consegue se explicar visualmente, inclusive, ao reiterar informações cruciais. Dessa maneira, o diálogo passa a assumir um caráter complementar.
Aliás, o filme conta com elementos típicos do ‘gore’, subgênero do terror marcado pela violência gráfica e, no caso, o grotesco se faz presente em determinadas cenas. Nessa linha, há um trabalho engenhoso de áudio associado, no qual o objetivo é causar sensações intensas, inclusive, a de repulsa.
Contudo, o que se apresenta nas entrelinhas é algo tão cortante e aviltante quanto a ferida purulenta ou mesmo o sangue que jorra. Nessa empreitada, o elenco segue afiado e disposto a contar a história.
Duas em uma só pessoa
Nessa trajetória, Demi Moore e Margaret Qualley interpretam as faces de uma mesma moeda. Ambas se despem de pudores e cumprem com o proposto.
Assim sendo, Demi revela maturidade artística ao expor o corpo, inclusive, em ângulos pouco harmônicos que ressaltam o passar dos anos. Um desapego louvável da artista, considerada um das mulheres mais belas de Hollywood.
Em contrapartida, Margareth se desnuda e esbanja sensualidade na pele de Sue. Esse é um desafio para a jovem atriz, cujo objetivo vai além da mera erotização.
Curiosamente, personagens fortes e ainda assim frágeis. São destemidas e não medem esforços, no entanto, necessitam da validação alheia a todo o custo.
Já Dennis Quaid é certeiro ao encarnar Harvey, um profissional do alto escalão de uma emissora de televisão. Por mais caricato que possa parecer, ele é uma figura até condizente com a realidade.
Beleza e estranheza
Vale destacar o trabalho do diretor de fotografia Benjamin Kracun. Ele consegue evidenciar as mudanças da protagonista. Nesse sentido, há também um trabalho eficiente da equipe de caracterização.
Mas o que o espectador observa? À primeira vista, Elisabeth é apresentada como uma mulher belíssima, ativa e vitoriosa.
Todavia, a partir do momento em que passa a lidar com o etarismo e tudo mais de sombrio que a cerca, a autoimagem muda e ela passa a ser retratada dentro de uma perspectiva de estranheza e, gradativamente, assume outro perfil.
Prós e contras em foco
Ao trilhar pelo caminho do exagero, a autora prioriza o impacto visual aliado a uma crítica irreverente, mesmo que isso signifique abrir mão de uma linha de raciocínio mais verossímil, em especial, nas cenas que culminam para o clímax.
Logo, trata-se de uma escolha narrativa. No final das contas, o resultado é impressionante e a mensagem é transmitida com afinco.
Aliás, impactar é algo que Coralie Fargeat se propõe a fazer e realiza com êxito. Enfim, para quem busca algo que saia do lugar comum, ‘A Substância’ é uma ótima opção.