Michel Hazanavicius propõe uma viagem bem humorada ao universo de um dos maiores nomes da Nouvelle Vague, Jean-Luc Godard. Marcado pelo uso da metalinguagem e algumas pitadas de drama e romance, ‘O Formidável’ se apropria da estética vanguardista e traz o ator Louis Garrel como protagonista em uma atuação convincente.
Baseado na autobiografia de Anne Wiazensky, a trama exibe o relacionamento amoroso dela com Godard durante um período de forte engajamento político do cineasta. O lançamento de ‘A Chinesa’ (1967) funcionou como o estopim do ativismo e significou uma mudança definitiva na relação do diretor com a sétima arte.
Na pele do protagonista, Louis Garrel abandona o perfil de galã e convence no papel do cineasta, um ser humano marcado pelo fervor idealista e por uma postura pouco flexível. Além disso, o longa também retrata o homem de encontro às inseguranças do envolvimento com uma mulher bela, jovem e independente.
Vale ressaltar o desempenho correto de Stacy Martin como a jovem atriz contida que faz par romântico com o personagem central, aliás, Martin despontou em ‘Ninfomaníaca’ (2014) de Lars Von Trier. Apesar do filme não investir em cenas tórridas de sexo, a nudez está presente e tal aspecto rende momentos irreverentes e levanta o debate sobre a exposição do corpo no audiovisual.
Quando o cinema fala de si
A metalinguagem se faz presente, o cinema que fala de si como em ‘O Desprezo’ (1963) de Godard ou mesmo ‘O Artista’ (2011) do próprio Michel Hazanavicius. As experimentações estéticas da Nouvelle Vague são fortes, como exemplo disso, a imagem que muda de tonalidade. A produção se inspira claramente nas peculiaridades dos trabalhos de Jean-Luc Godard.
Com humor ácido, o longa também promove a quebra da quarta parede, momento no qual o personagem fala para a câmera e se dirige ao expectador. As ousadias na forma e a forte referência cinematográfica podem cativar os cinéfilos.
Ponto de vista
O romance, a relação com os amigos, os questionamentos sobre o capitalismo, as lutas e as fragilidades do artista são expostas pela perspectiva de Hazanavicius, mas tudo ancorado pelo ponto de vista de Anne Wiazensky, como fica evidente durante a exibição.
Não se trata de um documentário e não se propõe um estudo histórico sobre Godard com uma investigação em profundidade ou mesmo uma maior preocupação com o discurso polifônico na busca pela suposta imparcialidade, até porque o roteiro é inspirado na obra da então companheira dele.
Se em ‘O Artista’ Hazavinicius detém maior poesia e adota uma estética e linguagem peculiar à produção clássica hollywoodiana, nesta nova produção, ele transita pela comédia de costumes e pelo vanguardismo estético da nouvelle vague, uma fonte menos conhecida do grande público. Diferenças à parte, ‘O Formidável’ merece ser visto.