Sob a direção de Yannick e Jérémie Renier, ‘Carnívoras’ lança um olhar sobre a relação de amor, ódio e cobiça entre duas irmãs. Todavia, o filme prioriza a perspectiva de uma delas e apesar do aspecto previsível, a narrativa captura a atenção e cumpre com aquilo proposto, inclusive, pelo título.
Na trama, Mona (Leïla Bekhti) trabalha como assistente de Samia (Zita Hanrot), uma atriz de carreira promissora, mas também uma pessoa de gênio forte e grande instabilidade emocional. Unidas pelo vínculo profissional e também sanguíneo, as irmãs terão que lidar com as frustrações e se enfrentar.
Foco em Leïla Bekhti, Mona está em cena e entoa o texto em uma audição com o objetivo de conquistar um papel, o cenário é um set bem iluminado (High key). Mas esta não é a configuração principal do filme e, ao longo da narrativa, a fotografia adota um clima mais soturno e muitas cenas de impacto se dão durante a noite ou mesmo em ambientes fechados com luz gradual ou dura.
Roteiro e discurso
Nesta trajetória, o roteiro prioriza o ponto de vista de Mona. Leïla Bekhti dá vida a essa mulher de pretensões artísticas frustradas e que precisa lidar a todo o momento com o sucesso da irmã, esta retratada como uma figura talentosa, porém, egoísta e pouco afável.
Conceder protagonismo a uma dessas personagens não é um problema, apenas uma escolha, todavia, um maior equilíbrio neste aspecto enriqueceria a obra. Na verdade, a personagem de Zita Hanrot é uma espécie de diva e funciona como um objeto de desejo. Para a irmã, ela é a detentora de tudo aquilo almejado e tal situação fica logo evidente para o espectador.
Com a direção dos irmãos Rénier, a trama parte de um lugar de fala masculino, mais tradicional e distante do conceito de sororidade. Há uma ideia de sucesso profissional como foco, todavia, isso também está associado a um senso de vitória dado àquela mulher detentora de marido e filho. Um pensamento ainda pungente na sociedade e aproveitado pela ficção.
Enquanto obra cinematográfica, adota uma forma mais contida, sem ousadias na montagem em si, mas lida bem com a ideia do voyeurismo e cativa o olhar. Sem diálogos marcantes, o trajeto narrativo já é o esperado, com algumas situações previsíveis e o próprio desenvolvimento da relação com os demais familiares delas já fornece alguns indícios do desfecho.
No mais, o longa exibe cenas tecnicamente bem dirigidas e a condução da história captura a atenção. ‘Carnívoras’ retrata a perigosa relação de amor e ódio entre essas duas mulheres e, para além disso, propõe uma reflexão sobre a voracidade humana, esta impulsionada pelo desejo.