A história de ‘Vera’ (Elena Anaya) – figura enfaixada no pôster de divulgação- pode parecer surreal. No entanto, se forem levados em conta os avanços da ciência e a devastadora crueldade humana, a trama pode ser encarada como uma realidade desoladora. Sem fazer spoiler, mas o segredo dela é conhecido no momento em que o cirurgião plástico vivido por Banderas, sujeito até então tranquilo, tem seu lado sombrio revelado.
Neste filme, Almódovar investe em sequências mais violentas. Aliás, a violência sexual já havia sido abordada em Volver (2006), mas não de forma tão clara quanto em ‘A pele que Habito’. Em Kika (1993), a violência contra a mulher já havia sido mostrada, mas não do mesmo modo. Aliás, algumas sequências lembram muito Kika, mas sem o tom de comédia.
Ao contrário de trabalhos anteriores, como Volver (2006), o diretor não investe no humor, o filme atual possui uma irreverência até cruel. As marcas de Almodóvar estão presentes na importância dada à apresentação da canção popular, e no uso do tom vermelho, bem mais contido nessa trama. Quanto às questões de gênero e identidade sexual, elas estão presentes no filme, mas não são perceptíveis no início da narrativa.
No filme o esmero em cada sequência e atuação são perceptíveis, os closes são caprichados. Depois de anos sem trabalhar com o diretor, Antônio Banderas está de volta como protagonista. Assim como com Penélope Cruz em ‘Volver’(2006) e Abraços Partidos (2009), Pedro Almodóvar consegue extrair do ator o melhor.
Nas mãos do autor de Fale com Ela (2002), Banderas incorpora um perfeito Dr. Jekyll de O Médico e o Monstro. Enquanto Vera causa estranhamento no público ao ser revelada como uma espécie de Frankenstein hipermoderno. Prepare-se para algumas sequências de pura maldade e uma história impensável, mas assustadoramente possível. O filme não tem o mesmo tom dos últimos trabalhos do diretor.